sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Estudo analisa habilidade da escrita de estudantes universitários

Prof. Raquel Meister, especialista em
Linguística (Foto: Ascom/UFS)
Mesmo com o aumento nacional do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2007 a 2009 em todas as etapas da educação básica, o desempenho de muitos estudantes ficou aquém do esperado. As metas específicas estabelecidas por 23% dos municípios do país para o últimos anos do ensino fundamental não foram alcançadas; 21% registraram queda do Ideb, totalizando 1.146 cidades.

No ensino médio, cinco estados, incluindo Sergipe, obtiveram nota inferior à estipulada por seus governos. A média nacional nessa faixa de ensino foi de 3,6, considerada a mais baixa.



O Brasil ainda apresenta fatores que diminuem o desempenho na educação, como alta taxa de repetência escolar e baixo índice de conclusão da educação básica, de acordo com informações da Unesco presentes no “Monitoramento de Educação para Todos 2010”. De 2005 a 2007, o país perdeu 12 posições no índice de educação feito pela organização, ficando em 88° lugar entre 128 países.

Nesse contexto da educação, a habilidade de leitura e escrita dos estudantes é um aspecto da aprendizagem que acaba sendo prejudicado. Foi o que constatou uma pesquisa orientada pela professora Raquel Meister Ko Freitag, especialista em Linguística, do Núcleo de Letras da UFS.

Intitulado “Não sei escrever: habilidade da escrita acadêmica dos graduandos do campus universitário Prof. Alberto Carvalho/UFS”, o trabalho mostra que a deficiência na escrita se estende da educação básica para o ensino superior. Como a universidade oferece poucos meios para aperfeiçoar essa habilidade, pois pressupõe o conhecimento da língua por parte dos aprovados no vestibular, o aluno encontra dificuldade para realizar tarefas básicas, como por exemplo, escrever um fichamento, uma resenha ou responder a uma prova.

“Aplicamos um questionário de autoavalição em 45 alunos de vários cursos do campus de Itabaiana. Percebemos que o aluno encontra dificuldades para se expressar textualmente, falta domínio das normas gramaticais e ortográficas. Eles próprios reconhecem isso como algo prejudicial ao desenvolvimento das atividades acadêmicas”, diz a professora.

Outros estudos brasileiros sobre o tema foram feitos com resultados semelhantes. Em 2006, as pesquisadoras da Universidade de São Francisco Neide de Brito Cunha e Acácia A. Angeli dos Santos divulgaram os resultados dos testes aplicados em 134 alunos de duas instituições particulares de nível superior de São Paulo e Minas Gerais. Eles confirmam que a habilidade de leitura e escrita dos universitários está aquém do esperado. Percebeu-se ainda que quanto menor a compreensão em leitura, maior a ocorrência de erros na produção escrita.

A conclusão do projeto desenvolvido por Raquel Meister aponta uma possível solução para o quadro. “A análise das respostas indica a necessidade de incluir na grade curricular de todos os cursos uma disciplina voltada para o aprimoramento da escrita”, afirma. Mas, a questão levantada é: a universidade estaria assumindo dessa forma uma responsabilidade da escola básica?

Matéria em Vídeo (Produção: Ascom/UFS)


Adaptação

Para suprir a falta de domínio da língua portuguesa dos seus alunos, um dos professores do curso de Matemática do campus de Itabaiana passou a levar textos para trabalhar em sala de aula, conforme relata o estudante universitário Fábio Oliveira Santos, do 6º período. Seu colega de curso, Anderson Góis, do 2º período, diz que recentemente passou a sentir dificuldades para atender às exigências da graduação. “Minha turma está achando complicado elaborar artigos. Acho que uma disciplina própria para escrever textos ajudaria a fazer os trabalhos que os professores pedem”.

A necessidade de produzir conhecimento acadêmico e prepará-lo para uma possível publicação dentro dos parâmetros exigidos pelos órgãos de pesquisa leva os alunos a buscar formas de aprimorar sua escrita. Foi o que aconteceu com Rosenilde Alvez dos Santos, do 8º período de Pedagogia. “A disciplina de metodologia científica me ajudou na adaptação do texto do ensino médio para o da universidade. Entrar em um projeto de pesquisa ou participar de eventos pode ser uma boa forma de desenvolver a escrita”.

Jackeline de Carvalho Peixoto, 6º período de Letras, uma das estagiárias do grupo de pesquisa da professora Raquel Meister, diz que é comum sentir o impacto da mudança da escola para a universidade e que até hoje ainda encara o texto acadêmico como um desafio. No entanto, segundo ela, a formação básica não ofereceu suporte necessário para o aprimoramento da escrita. “Na escola, produzíamos redação, mas não havia debates para melhor compreensão do assunto. Só no último ano do ensino médio é que começamos a desenvolver esse lado. Mesmo assim, muitos estudantes não tinha estímulo para ler e praticar”.

O professor de Física José Gerivaldo dos Santos Duque diz que os estudantes apresentam dificuldade em expressar suas ideias nos testes e relatórios. Além disso, também existe o problema de muitos não saberem interpretar o enunciado da avaliação. “Acredito que essa é uma falta que vem da base, de uma ensino deficiente”, diz o professor.

Soluções

A professora Raquel Meister mostra a importância da boa capacidade de expressão lingüística. “O domínio da norma culta da língua confere poder, pois é uma ferramenta importante no exercício da cidadania”, afirma. Para solucionar o problema verificado através da pesquisa, que reflete uma realidade não apenas sergipana, mas do país inteiro, não bastam medidas emergenciais: é preciso que a universidade e a escola básica se unam no compromisso de garantir uma educação plena ao estudante. “Adicionar na universidade uma disciplina de aprimoramento dessa habilidade seria uma medida paliativa. A solução definitiva é colocar professores preparados para romper com esse ciclo nas escolas”, explica Raquel.

Foi por isso que em maio de 2010 teve início outro projeto da professora, que leva os graduandos de licenciatura de Itabaiana às escolas. A ideia é fazer um diagnóstico da escola selecionada para depois aplicar ações específicas de acordo com os problemas encontrados. “Queremos incentivar o estudante a permanecer na escola depois da graduação, e prepará-los para lidar com a realidade da sala de aula”.

A linha de pesquisa da professora engloba também ações de aprimoramento da escrita na comunidade acadêmica, através de oficinas e minicursos ligados ao tema. Ainda há a produção de uma revista de divulgação científica denominada Feira de Ciência e Cultura, para publicar os trabalhos produzidos pelos pesquisadores da universidade.

Por Raquel Brabec, publicada originalmente no Portal UFS
Agência UFS de Divulgação Científica (comunica@ufs.br)

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